A hérnia inguinal representa uma das condições mais frequentes na prática cirúrgica moderna, demandando uma abordagem personalizada que considere tanto opções cirúrgicas quanto conservadoras.

Em minha experiência de mais de 15 anos como cirurgião do aparelho digestivo em Goiânia, observo que a escolha adequada entre o tratamento de hérnia inguinal cirúrgico e não cirúrgico deve ser baseada em diversos fatores individuais.

A consulta inicial com um gastroenterologista especialista é fundamental neste processo, pois somente este profissional possui o treinamento específico para avaliar desde o esôfago até o reto, incluindo órgãos acessórios como fígado e pâncreas, permitindo uma avaliação completa e integrada do quadro do paciente.

Neste artigo, irei abordar as abordagens cirúrgicas e não cirúrgicas para tratar a hérnia inguinal, bem como a importância de uma análise individualizada de cada caso.

Epidemiologia e impacto clínico das hérnias inguinais

As hérnias inguinais representam uma parcela significativa da demanda cirúrgica mundial, com aproximadamente 20 milhões de procedimentos realizados anualmente.

Em meu consultório, observo uma predominância masculina expressiva, corroborando dados da literatura que apontam maior incidência em homens.

A condição frequentemente impacta a qualidade de vida, com sintomas que variam desde desconforto leve até dor incapacitante durante atividades cotidianas.

As hérnias inguinais são classificadas em diretas e indiretas, com mecanismos fisiopatológicos distintos.

As indiretas ocorrem devido ao não fechamento do conduto peritônio‑vaginal, criando uma comunicação entre a cavidade abdominal e o canal inguinal, enquanto as diretas resultam do enfraquecimento da musculatura da parede posterior do canal inguinal, especificamente no triângulo de Hesselbach.

Tratamento de hérnia inguinal cirúrgico e não cirúrgico: Avaliação diagnóstica personalizada

O diagnóstico preciso é determinante para definir se o tratamento de hérnia inguinal será ou não cirúrgico, e baseia‑se principalmente no exame físico detalhado.

Primeiramente, o médico faz uma avaliação com o paciente em posição ortostática e realiza a manobra de Valsalva, o que aumenta significativamente a sensibilidade do exame.

Para casos complexos ou duvidosos, exames complementares são solicitados, como ultrassonografia da região inguinal ou, menos frequentemente, tomografia computadorizada.

A classificação de Nyhus, que utilizo rotineiramente, categoriza as hérnias em tipos I a IV baseando‑se em características anatômicas e grau de comprometimento da parede posterior, proporcionando direcionamento terapêutico personalizado.

Tratamento não cirúrgico de hérnia inguinal: quando esperar é uma opção válida

O paradigma tradicional que indicava cirurgia para todos os casos de hérnia inguinal tem sido progressivamente questionado.

Grande parte dos profissionais tem adotado a conduta expectante (watchful waiting) para pacientes selecionados, especialmente idosos com hérnias pouco sintomáticas ou assintomáticas.

Esta abordagem encontra respaldo científico em estudos robustos, como o publicado no The Journal of the American Medical Association (JAMA) em 2006, que acompanhou 720 homens divididos entre conduta cirúrgica (356) e expectante (364).

O estudo demonstrou que apenas 0,3 % dos pacientes em observação necessitaram de cirurgia emergencial por estrangulamento durante dois anos de seguimento.

Um estudo ainda mais longo, com 12 anos de acompanhamento, reportou taxa de encarceramento de 3,9 % (10/255 pacientes) no grupo submetido a observação, uma incidência relativamente baixa considerando o longo período de seguimento.

Neste mesmo estudo, embora a maioria dos pacientes sob observação tenha eventualmente optado pela cirurgia, especialmente aqueles com sintomas leves iniciais, a abordagem conservadora mostrou‑se segura quando adequadamente monitorada.

Em meu consultório, estabeleço critérios rigorosos para indicar a conduta expectante, incluindo avaliações periódicas a cada seis meses, orientações sobre sinais de alerta e garantia de acesso rápido em caso de complicações.

Modalidades cirúrgicas contemporâneas: da técnica aberta à laparoscopia

Quando a cirurgia se mostra necessária, atualmente há um arsenal terapêutico que contempla tanto técnicas tradicionais quanto minimamente invasivas. As abordagens cirúrgicas dividem‑se essencialmente em:

Técnicas abertas

Para hérnias específicas, especialmente em pacientes com contraindicações à anestesia geral, técnicas como Bassini ou McVay são empregadas, que apresentam taxas de recidiva comparáveis (2,89 % e 2,67 %, respectivamente) quando realizadas por cirurgiões experientes.

Esta abordagem oferece visualização direta das estruturas anatômicas e pode ser realizada sob anestesia local ou raquidiana, favorecendo pacientes com comorbidades significativas.

Abordagens laparoscópicas

A laparoscopia representa um avanço significativo, oferecendo menor dor pós‑operatória, recuperação mais acelerada e resultados estéticos superiores.

Nos últimos anos, tenho privilegiado a técnica transabdominal pré‑peritoneal (TAPP), observando retorno mais rápido às atividades habituais e menor necessidade de analgésicos no pós‑operatório.

A técnica laparoscópica requer equipamento especializado e treinamento específico, mas os benefícios justificam o investimento.

Nos pacientes que opero por esta via, constato menor incidência de dor crônica pós‑operatória, uma complicação potencialmente debilitante que afeta 10–12 % dos pacientes submetidos a técnicas abertas.

Tomada de decisão individualizada

A individualização do tratamento é o pilar da minha abordagem terapêutica.

Para jovens atletas com hérnias sintomáticas, frequentemente recomendo a intervenção cirúrgica precoce para evitar limitações nas atividades físicas.

Já para pacientes idosos, com múltiplas comorbidades e hérnias pequenas e assintomáticas, a conduta expectante tem demonstrado excelentes resultados.

Dedico tempo considerável para explicar as opções terapêuticas, riscos e benefícios de cada abordagem.

Percebo que pacientes bem informados fazem escolhas mais alinhadas com suas expectativas e apresentam maior satisfação com os resultados, independentemente da opção selecionada.

Conclusões e perspectivas futuras

O tratamento contemporâneo das hérnias inguinais demanda uma abordagem flexível e individualizada.

A antiga noção de que toda hérnia inguinal deve ser operada carece de fundamentação científica atual.

Como especialista em cirurgias minimamente invasivas do aparelho digestivo, reconheço tanto o valor das técnicas cirúrgicas modernas quanto o papel da conduta expectante em casos selecionados.

A decisão entre tratamento de hérnia inguinal cirúrgico ou não cirúrgico deve considerar múltiplos fatores: idade, sintomatologia, comorbidades, características anatômicas da hérnia e preferências do paciente.

Em todos os cenários, o acompanhamento médico regular por um cirurgião do aparelho digestivo permanece indispensável para garantir a segurança e eficácia terapêutica.

A cirurgia, quando indicada, deve empregar a técnica mais adequada ao perfil do paciente, reconhecendo que tanto abordagens abertas quanto laparoscópicas podem oferecer resultados excelentes quando executadas por profissionais adequadamente treinados.

O futuro aponta para técnicas cada vez menos invasivas, com recuperação mais rápida e menor impacto na qualidade de vida dos pacientes.

Dr. Thiago Tredicci, Gastroenterologista e Cirurgião do Aparelho Digestivo. Experiente em cirurgia geral. CRM GO 12828, RQE 8168 e 8626.